Registro da propriedade de navios e a adoção debandeira de conveniência

O registro da propriedade das embarcações determina a sua nacionalidade. Efetuado o registro a embarcação estará habilitada a arvorar o pavilhão do Estado de Registro, além de ter a proteção no alto-mar e de outras vantagens inerentes à nacionalidade. A prova da nacionalidade se faz pela Provisão do Registro de Propriedade Marítima (PRPM), um dos documentos de bordo obrigatórios.
Hasteando a bandeira de uma nação, o navio passa a ser parte integrante do território dela, nele dominando as suas leis e convenções internacionais ratificadas pelo Estado de Registro.
A Convenção das Nações Unidas Unidas sobre Direito do Mar (CNUDM III), art. 91, exige que haja um forte elo de ligação entre o Estado do pavilhão e o navio preconizando que Estados signatários deverão estabelecer os requisitos necessários para a atribuição da sua nacionalidade a navios, para o registo de navios no seu território e para o direito de arvorar a sua bandeira.
Destarte, os navios possuem a nacionalidade do Estado cuja bandeira estejam autorizados a arvorar, devendo existir um vínculo substancial entre o Estado do Registro e o navio.
                  Considerando as condições e pressupostos adotados pelos diversos países, os registros das embarcações podem ser classificados em Registros Nacionais e em Registros Abertos.
Nos Registros Nacionais o Estado que concede a bandeira mantém um efetivo controle sobre os navios nele registrados, mantendo-os atrelados à sua legislação.
Os regimes Abertos se dividem em Registros de Bandeira de Conveniência e Segundos Registros.
Os Registros Abertos de Bandeiras de Conveniência (BDC)se caracterizam por oferecerem total facilidade para registro, incentivos de ordem fiscal, não imposição de vínculo entre o Estado de Registro e o navio. Ademais, tais Estados não exigem e nem fiscalizam, com o devido rigor, o cumprimento e a adoção das normas e regulamentos nacionais ou internacionais sobre as embarcações neles registradas. Simultaneamente às vantagens econômicas oferecidas por tais registros ainda se elenca legislações e regulamentos menos severos sobre segurança e equipamento de bordo. não exigem nenhum vínculo entre Estado de Registro e navio . A não exigência de vínculo do Estado da Bandeira com o navio e a não observância de legislações e regulamentos severos concernetes à segurança da navegação e obrigação de fiscalizar dos Estados decorre do fato dos Estados que concedem bandeira de conveniência não serem signatários da CNUDM III e de outras convenções internacionais de extrema importância no cenário da navegação, como a MARPOL, SOLAS 1974, CLC/69, dentre outras.
Neste contexto competitivo, é menor a influência do direito custo, ou seja, das normas de direito que interferem no custo do frete, em especial as normas trabalhistas, tributárias e relativas a segurança marítima e poluição marinha. Neste contexto, a adoção de BDC consiste em estratégia empresarial que visa maior eficiência e lucratividade.
Há que se destacar neste ínterim se os benefícios conjunturais da adoção de Bandeiras de Conveniência compensam alguns aspectos negativos de extrema relevância: o alto índice de desastres marítimos envolvendo navios que ostentam BDC, as condições insatisfatórias de trabalho da tripulação, a evasão de divisas dos países que concedem Registros Nacionais e o fenômeno do tráfego de terceira bandeira. Ademais, outro aspecto que vem preocupando a comunidade marítima internacional respeita à possibilidade de navios de BDC serem aproveitados em ataques terroristas.
Os navios que arvoram pavilhões de conveniência não integram, de modo efetivo a economia dos Estados de Registro, não servem a seu comercio exterior nem são para tais países positivamente produtores de divisas, salvo no concernente aos direitos de inscrição. Efetivamente, tais navios não frequentam, com regularidade seu porto de matrícula. Ao contrário, realizam o chamado “tráfico de terceira bandeira”, ou seja, promovem um tráfico marítimo estranho a mobilização do comércio exterior do país cuja bandeira arvoram. Em consequencia, as possibilidades concretas do controle, fiscalização e inspeção do navio por parte das autoridades do Estado de Registro são praticamente inexistentes.
Ademais, os navios de bandeira de conveniência vem causando perdas econômicas e evasão de divisas significativas à países que concedem Registros Nacionais. No Brasil, apenas 3% do total arrecadado com fete é gerado por navios que ostentam a bandeira brasileira. Estima-se evasão de divisas na ordem de US$ 6 bilhões em 2002 provocadas pela adoção de BDC. [1]
Atualmente, os principais países de bandeira de conveniência são: Libéria, Panamá, Honduras, Costa Rica, Bahamas, Bermudas, Singapura, Filipinas, Malta, Antigua, Aruba, Barbados, Belice, Bolivia, Birmania, Camboia, Ilhas Canarias, Ihas Caimán, Ihas Cook, Chipre, Guine Equatorial, Registro Marítimo Internacional de Alemanha, Gibraltar, Líbano, Luxemburgo, Ilhas Marshall, Mauricio, Antilhas Holandesas, San Vicente, Santo Tomé e Príncipe, Sri Lanka, Tuvalu, Vanuatu dentre outros, permitem que navios que não possuem vínculo nacional, arvorem sua bandeira.
O   Segundo Registro ou Registro Internacional “Second Register” ou “Off Shore Register”, foi criado em alguns Países visando resguardar a sua frota mercante oferecendo vantangens similares às bandeiras de conveniência . O Segundo Registro é concedido por países que já possuem registro nacional a navios de sua nacionalidade ou de outras auferindo vantagens similares às concedidas por bandeiras de conveniência. Submete o navio a todas as leis e convenções internacionais concernentes à segurança da navegação, excetuando, em alguns países, as leis trabalhistas, subvenções e incentivos concedidos aos navios do registro nacional.
 O Brasil instituiu o segundo registro denominado Registro Especial Brasileiro (REB) pela Lei no 9.432/97 que dispõe sobre a ordenação do transporte aquaviário e dá outras providências.
 
Eliane M. Octaviano Martins[2]
 


[1]Segundo um estudo da União Européia o problema é estrutural. Entre as isenções nas taxas por tonelada transportada e a redução dos custos laborais os armadores economizam uma cifra superior a um milhão de dólares ao ano, por navio. Os dados da frota mercante européia demonstram que 67% dos navios ostentam Bandeiras de Conveniências (BDCs). Especificamente, na Espanha 54% dos navios adotam bandeiras de outros países e 45% ostentam Registro Especial das Ilhas Canarias, restando portanto um 1% da frota na adoção do registro nacional da Espanha.[1] Segundo a ITF, o número de navios BDC aumenta a cada dia, enquanto as frotas mercantes nacionais, especialmente as dos países em desenvolvimento, estão cada vez mais escassas.
[2]. Autora do Curso de Direito Marítimo, Editora Manole. Professora de Direito Marítimo, Direito Empresarial e Direito Internacional em cursos de graduação e Pós-graduação. Mestre pela UNESP e Doutora pela USP.Vice-Presidente do Instituto Paulista de Direito Comercial e Integração – IPDCI.

Eliane M. Octaviano Martins

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